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Sumaia Almeida Ramos: das margens do São Francisco à grande trajetória como egressa do PROFMAT

Matemática de 33 anos guarda semelhanças com canção de Alceu Valença sobre dicotomia entre Juazeiro e Petrolina, municípios impactados por suas contribuições, e é um caso de sucesso do programa coordenado pela SBM

Sumaia Almeida Ramos é egressa do PROFMAT e hoje preside a Associação Nacional dos Professores de Matemática na Educação Básica (ANPMat) | Foto: Arquivo Pessoal

Há quase 15 anos em vigor, o Programa de Mestrado Profissional em Matemática (PROFMAT), coordenado pela Sociedade Brasileira de Matemática (SBM), já atuou na capacitação de mais de 7.800 egressos da disciplina nos 26 Estados da federação e no Distrito Federal. 

Em tantos casos, a história dos seus egressos é tão rica que a influência do PROFMAT supera até a fronteira de Estados de uma região. Sumaia Almeida Ramos sentiu e ainda sente na pele os benefícios do programa da SBM que a faz transitar diariamente entre Bahia e Pernambuco. Atualmente responsável pela formação continuada dos professores de Matemática da rede municipal de Petrolina (PE), ela reside em Juazeiro (BA), cidades divididas por uma ponte de 880m no Vale do São Francisco. 

“De um lado do rio (São Francisco) é Bahia, do outro é Pernambuco. É como a música”, brinca a matemática de 33 anos, fazendo alusão à famosa canção ‘Petrolina Juazeiro’, de Alceu Valença. Sumaia, de fato, nasceu na margem do São Francisco, porém sua infância, época em que teve aflorado o gosto por Matemática, teve a pacata Casa Nova, no semiárido baiano, como palco. 

A origem no semiárido da Bahia 

Também margeada pelo ‘Velho Chico’, Casa Nova fica situada a cerca de 60 km de Juazeiro. De família originalmente humilde, Sumaia aprendeu a ser aplicada nos estudos desde pequena para ter uma vida melhor que a maioria de seus conterrâneos. No Ensino Fundamental, já era uma aluna com facilidade para as disciplinas de Ciências Exatas e sua madrinha contribuiu também para a escolha futura graças a um ‘plus’ que misturava o aspecto lúdico com o lado do mercado de trabalho.

“Minha madrinha foi uma referência, pois ela me deu meu primeiro jogo de quebra-cabeça, o que me interessou ainda mais por aquele aspecto lúdico do jogo e que aliava estratégia e decisão, que são naturais da Matemática. E ela também era contadora. Então, um dia pesquisei a profissão, perguntei aos professores e daí entendi que era alguém que trabalhava com Matemática”, conta a baiana. 

Apesar do apreço pelas disciplinas de Exatas, Sumaia também ‘mandava bem’ nas outras matérias. Tanto é que a Geografia também a ajudou ainda mais na arte de moldar sua futura preferência. “Lia bastantes livros, inclusive do IBGE, da parte de estatísticas. Então, imaginei que quem fazia Matemática poderia ser essas duas coisas: ou contadora ou estatística. Por mais que não tenha sido nenhuma das duas, eu tinha certeza que queria trabalhar com Ciências Exatas”, analisa.

As aulas particulares mágicas com o professor ‘Gangão’

Como o Ensino Básico de Casa Nova era limitado, Sumaia sabia que precisaria de um conteúdo mais robusto. Nem mesmo as experiências na Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP), em que passava frequentemente para a 2ª fase, e as aulas corriqueiras no colégio municipal seriam suficientes para passar em um vestibular. 

Por isso, ela contou com o auxílio de um professor muito decisivo no 3⁰ ano do Ensino Médio. “O professor ‘Gangão’ morava em frente da escola. Perguntei a ele quanto ele cobrava para me dar aulas particulares de Matemática. Ele disse R$ 30. Não é vergonha para mim, mas minha mãe recebia R$ 50 de auxílio do Bolsa Família. E como ela viu que queria muito estudar, ela disse para usar o dinheiro para pagar essa despesa”, revela.

Com isso, ela se acostumou a estudar Matemática de dia, de tarde e de noite. E nem mesmo mais um obstáculo financeiro a tirou do prumo.“Não sei qual foi o motivo, mas eu recebi esse auxílio somente por quatro meses. A partir do quinto, eu não tinha mais dinheiro para pagar ao ‘Gangão’. Mas mesmo assim, ele não me cobrou mais. ‘Você não é qualquer aluna’, ele me disse e lembro até hoje”, completa Sumaia.

Tanta resiliência e disciplina da baiana foram recompensadas em novembro de 2008, quando foi aprovada no curso de Licenciatura em Matemática pela Universidade de Pernambuco (UPE), onde frequentou as aulas no Campus de Petrolina. Só que nem mesmo as aulas com o professor ‘Gangão’ a deram total dimensão da realização que acabara de alcançar. 

“Ninguém me explicava o que era o curso de Matemática da UPE, nem sabia o que era Licenciatura. A gente não tinha essas explicações na escola. Eu pensava que ao cursar Licenciatura, eu poderia atuar como contadora ou na área de estatística como pesquisadora. Então fui só descobrir mesmo ali no primeiro período da faculdade e confesso que foi aquele momento de ‘Não sei se quero isso’”, narra Sumaia. 

Graduação em Matemática e o ‘clique’ com o PROFMAT

Das dúvidas nos primeiros seis meses, a concretude de decifrar os enigmas e solucionar problemas reais se tornou rapidamente sua paixão ao longo dos demais semestres de graduação. Sumaia se formou em 2013, mas já fazia parte do Programa de Aperfeiçoamento para Professores de Matemática do Ensino Médio (PAPMEM), do IMPA, sob coordenação do professor Severino Cirino de Lima Neto, que, curiosamente, também era coordenador do PROFMAT na Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf). 

Explica-se o elo que uniu a história de Sumaia com as de centenas de outros mestres formados pelo programa da SBM.  “Participei de umas quatro ou cinco edições seguidas do PAPMEM e foi ali que o Sirino começou a falar do PROFMAT. Lembro que, em 2014, eu ainda estava pensando se queria realmente entrar no programa, porque estava naquela fase também dos primeiros empregos, então adaptar estudo e trabalho também não era algo que me parecia ser fácil. Precisava pensar e me preparar para aquela realidade. Daí, o professor Cirino me incentivou a fazer porque eu teria o perfil. E ele me falou para participar do PAPMEM daquele ano que as aulas seriam suficientes para ser aprovada no PROFMAT. Se ele estava dizendo, né”, recorda a baiana. 

Um ano depois, lá estava Sumaia na Univasf frequentando as aulas do PROFMAT. Completou o Mestrado em 2017 com um trabalho focado no uso de jogos didáticos para o ensino de Aritmética Modular, orientado pelo próprio professor Cirino. Este trabalho não apenas cumpriu os requisitos do Mestrado com excelência, mas também se destacou pela fundamentação teórica sólida e pela descrição detalhada do processo educativo, evidenciando seu compromisso com a pesquisa e a prática pedagógica.

Além de sua dedicação acadêmica, ela envolveu-se ativamente em projetos de ensino e pesquisa, como sua participação no Núcleo de Pesquisa em Ensino de Matemática (Nupemat/Univasf), e sua atuação como voluntária no projeto ‘Descobrindo Talentos em Matemática’, voltado à preparação de alunos para a OBMEP. 

Desde 2021, Sumaia ocupa cargos na diretoria da Associação Nacional dos Professores de Matemática na Educação Básica (ANPMat), onde, atualmente, exerce a função de Presidente. “Foi através do PROFMAT que eu conheci a ANPMat. A propósito,  a ANPMat surge de egressos do PROFMAT. Eu aproveitei muito a experiência para desenvolver meu networking. Então, pude conhecer grandes professores por meio do programa que atuam na SBM e no IMPA e que também contribuíram para o que eu me tornei hoje”, destaca a pesquisadora. 

Graduada em Matemática pela UPE, Sumaia completou o PROFMAT em 2017 pela Univasf | Foto: Arquivo Pessoal

Para ela, é motivo de muito orgulho representar os municípios de Juazeiro e Casa Nova – sempre dividindo os ‘honorários’ pelo local de nascimento e a cidade onde passou sua infância – em cargos de excelência na área científica. E tudo isso foi possível graças à capacitação acadêmica que permeia os princípios do PROFMAT.

“Você ter no seu currículo que é mestre, ainda mais pelo PROFMAT, um curso ofertado pela SBM, o peso desses nomes, me traz muita visibilidade profissionalmente. Eu abri meu leque de oportunidades. E a grade de conteúdo do programa, inclusive, contribuiu para que entrasse em concursos no Estado de Pernambuco. Então, ele me deu essa bagagem, me trouxe uma visão diferente sobre certos conceitos de Matemática, aprofundou mais a forma como deveria abordá-los em sala de aula”, cita a matemática de 33 anos. 

Os benefícios do PROFMAT para o professor da Rede de Educação Básica de Ensino 

A caminhada de Sumaia de Almeida Ramos é somente um exemplo do impacto positivo que o PROFMAT pode proporcionar aos seus alunos e ao ensino de Matemática no Brasil. Sua atuação em diversas frentes da educação, seja nos papéis de liderança, na formação de professores, na pesquisa, ou no incentivo ao aprendizado matemático entre estudantes da educação básica, reforça sua importância como referência na área. 

E ela se sente no direito de aconselhar a nova geração de professores que sonham em fazer a diferença nas salas de aula no Brasil. 

“Façam o PROFMAT, porque essa é uma oportunidade de aperfeiçoamento profissional que, muitas vezes, não temos em nossa formação inicial. As lacunas só serão preenchidas quando você buscar essa capacitação dentro das formações continuadas e, principalmente, nos cursos de pós-graduação. E para esse professor da Educação Básica, o PROFMAT é essa oportunidade para ele levar uma aula que tenha significado para o estudante, para melhorar sua própria didática e, principalmente, para assumir uma postura de professor reflexivo em sua prática docente”, encerra a Presidente da ANPMat. 

Publicado emNotícias